Ônibus híbridos com célula a combustível serão testados no Brasil

Editoria: Vininha F. Carvalho 28/07/2006

A partir do próximo ano o Brasil dará o primeiro passo para o transporte urbano sem emissão local de poluentes com os testes do ônibus do futuro, movido a hidrogênio. No primeiro semestre de 2007 será testado o primeiro protótipo com tecnologia brasileira, desenvolvido pelo Laboratório de Hidrogênio do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Também no ano que vem, em São Paulo, entra em operação experimental o ônibus do programa do Ministério de Minas e Energia, coordenado pela Empresa Municipal de Transportes Urbanos (EMTU).

Os dois projetos prevêem a operação de ônibus híbrido com célula a combustível alimentada por hidrogênio e serão apresentados entre as novidades do setor no VE 2006 - 4° Seminário e Exposição de Veículos Elétricos que o INEE - Instituto Nacional de Eficiência Energética realiza nos dias 15 e 16 de agosto, na Escola SENAI Mário Amato – Faculdade SENAI de Tecnologia Ambiental (Avenida José Odorizzi, 1555), em São Bernardo do Campo.

Esses projetos permitirão ao Brasil entrar para o rol dos países que já desenvolvem essa tecnologia para o transporte rodoviário urbano. Experiências de uso de ônibus elétricos de célula a combustível em transporte público urbano estão em andamento em várias cidades da Europa, Estados Unidos, austrália e Japão.

Embora os projetos do Rio de Janeiro e de São Paulo envolvam veículos com célula a combustível que têm o hidrogênio como fonte de energia, as características são diferenciadas, principalmente em relação à produção do hidrogênio. O protótipo do COPPE, por exemplo, terá o hidrogênio produzido a partir do gás natural, enquanto o projeto coordenado pela EMTU vai gerar o hidrogênio por meio de eletrólise da água – processo químico de decomposição da água.


Operação experimental em São Paulo:

Até final de 2007 São Paulo deverá ter cinco ônibus híbridos com célula a combustível circulando no corredor São Mateus/Jabaquara que corta cinco municípios - São Paulo, Diadema, São Bernardo do Campo, Santo André e Mauá, totalizando 33 quilômetros de operação.

O projeto é uma parceria do Ministério de Minas e Energia e a EMTU/SP (Empresa Municipal de Transportes Urbanos), com apoio do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e do GEF (Global Environmental Facility). O programa terá um investimento da ordem de 16 milhões de dólares e visa estimular o desenvolvimento e a utilização de ônibus com célula a combustível de hidrogênio.

Segundo o gerente de desenvolvimento da EMTU e coordenador nacional do projeto, Márcio Rodrigues Alves Schetino, o projeto inclui, também, um eletrolisador para a produção do hidrogênio a partir da eletrólise da água e a montagem de uma central de abastecimento dos ônibus dentro da garagem da EMTU.

O projeto encontra-se em face de contratação com a assinatura do consórcio formado por oito empresas nacionais e internacionais, que oferecerá os ônibus e a estrutura de produção de hidrogênio. Está inserido no programa o conhecimento necessário para o manuseio do hidrogênio e para a operação dos ônibus com essa tecnologia e capacitação de pessoal.

“Esse projeto coloca o Brasil em uma posição de destaque em nível internacional, elevando-nos ao mesmo passo que outros países”, avalia o coordenador do projeto.

Os ônibus serão do tipo padrão, com 12 metros de comprimento, capacidade para 90 passageiros, piso baixo ao nível da calçada e tanque de hidrogênio na capota. Entre as vantagens estão a emissão zero de poluentes, veículos mais silenciosos que os convencionais com uma redução entre 20% e 30% no nível de ruído , e maior conforto, com a redução dos trancos que ocorrem nos trólebus.

Produção do hidrogênio:

Nesse projeto, os estudos de viabilidade apontaram como alternativa mais promissora a produção de hidrogênio por eletrólise da água, por se tratar de tecnologia bem conhecida e comercialmente disponível. Considerando uma planta de produção que opere por 20 horas por dia durante o período fora do horário de pico, esse processo deverá acarretar em custos operacionais menores, equiparados ao dos trólebus; os antigos ônibus elétricos que operam em São Paulo, cabeados na rede elétrica.

Para a produção do hidrogênio será instalada uma infra-estrutura completa composta de eletrolisador para produção, tanques de alta pressão para armazenamento do hidrogênio e dispenser[1] para o abastecimento dos veículos.

De acordo com o coordenador do projeto, Márcio Rodrigues Alves Schetino, o ônibus será abastecido com cerca de 40 quilos de hidrogênio para um dia de operação, circulando entre 300 e 350 quilômetros, mesma autonomia dos ônibus convencionais a diesel.

A média de consumo de hidrogênio esperada é de 14 quilos de hidrogênio por 100 km. Na opinião dele, a célula a combustível de hidrogênio é a solução para São Paulo, mas, como transporte em grande escala, serão necessários cerca de 15 anos. “Dependemos ainda da redução do custo, mas se não começarmos agora não teremos, no futuro, uma solução sem emissão”, avalia.
Pesquisa carioca

O ônibus carioca está sendo projetado para ser veículo urbano com autonomia de 300 km, a mesma dos modelos convencionais movidos a diesel. Com tamanho padrão de 12m de comprimento, terá capacidade para transportar 109 passageiros, sendo 37 pessoas sentadas.

No primeiro semestre de 2007 o veículo estará circulando na Ilha do Fundão/UFRJ para a realização dos testes de desempenho e, em seguida, será colocado em operação em um corredor de ônibus convencional do Rio de Janeiro. O fornecimento do hidrogênio será viabilizado pela Petrobrás, que já iniciou a construção de um posto de abastecimento localizado nem seu Centro de Pesquisa (CENPES), também na Ilha do Fundão. O hidrogênio será produzido no próprio posto a partir do gás natural.

O protótipo foi projetado para utilizar somente a energia proveniente da célula a combustível alimentada a hidrogênio e de baterias. A célula a combustível é uma tecnologia que utiliza o hidrogênio e o oxigênio para gerar eletricidade com alta eficiência, e também vapor d’água quente resultante do processo químico na célula a combustível.

A importância da célula está na sua alta eficiência e na ausência de emissão de poluentes, uma vez que não existe a combustão e a única emissão é o vapor d’água. A reação do hidrogênio na célula faz funcionar o motor elétrico que acaba descartando apenas água do escapamento, sob a forma de líquido ou vapor.

O ônibus é denominado híbrido por ter um gerador de energia elétrica a bordo – que é a célula a combustível, fornecendo energia elétrica para acionamento do motor elétrico de tração e carregamento das baterias. Nas situações em que é necessária maior potência, a bateria fornece ao motor elétrico energia elétrica auxiliar. A reação do hidrogênio na célula faz funcionar um motor elétrico que acaba descartando apenas água do escapamento, sob a forma de líquido ou vapor.

O projeto coordenado pela COPPE, com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Petrobrás, resultará na construção do primeiro ônibus híbrido com célula a combustível de hidrogênio com tecnologia nacional. De acordo com o chefe do Laboratório de Hidrogênio da COPPE e coordenador do projeto, Paulo Emilio Valadão de Miranda, o foco é o desenvolvimento da tecnologia.

“Ao invés de comprar essa tecnologia pronta, estamos desenvolvendo várias partes aqui no Brasil, como o chassi, a carroceria, o sistema de tração e todos os sistemas relativos ao gás, como os tanques de armazenamento”, explica. Para isso, o projeto conta com a parceira de empresas, como a Busscar, de Joinville, responsável pela construção do chassi e da carroceria, e a Eletra, de São Paulo, que está desenvolvendo o sistema de tração do veículo.
Sistema de tração

A Eletra, indústria brasileira fabricante de veículos elétricos híbridos pesados, parceira no projeto da COPPE, participará com o desenvolvimento de tração híbrida (motor elétrico) e do sistema auxiliar para o funcionamento de equipamentos como o compressor de ar, freio e ar condicionado.
A parceria surgiu durante o 2º Seminário sobre VEH, realizado pelo INEE, em abril de 2004, em São Paulo, quando o professor Paulo Emílio teve oportunidade de conhecer o diretor técnico da Eletra, o engenheiro Antonio Vicente A. Souza e Silva.

Segundo o engenheiro, a tecnologia do sistema híbrido já existe há cinco anos e está amadurecida. Em sua opinião, a grande novidade é a célula a combustível de hidrogênio, que alimentará a parte elétrica, porém trata-se de tecnologia ainda muito cara -- o sistema de célula de hidrogênio custa cerca de 70 mil dólares --, além do tanque de hidrogênio que também tem um custo bastante elevado. Diante disso, ele aponta um prazo de pelo menos 10 anos para viabilizar essa tecnologia no transporte público no país.

Vantagens:

Além do desenvolvimento da nova tecnologia, o protótipo nacional possui vantagens energéticas e ambientais. “Em primeiro lugar, a grande vedete é a questão do meio ambiente”, destaca o professor Paulo Emilio Valadão de Miranda. Segundo ele, hoje, nos grandes centros urbanos, os ônibus com motor de combustão interna a diesel representam a grande parcela de contaminação do meio ambiente. O protótipo produzirá somente o vapor d’água como subproduto.

Outra vantagem está no próprio design com o desenvolvimento de um chassi de piso baixo, que chega ao nível da calçada para permitir o acesso fácil das pessoas ao veículo. Internamente, o ônibus foi concebido com mais espaço livre, inclusive para transporte de cadeirantes, e maior conforto do usuário.
O professor destaca, ainda, as vantagens técnico-econômicas da opção híbrida.

Segundo ele, em alguns projetos desenvolvidos em outros países como os europeus, foram utilizadas pilhas a combustível de 240 quilowatts para movimentar o veículo, tornando os sistemas de bateria muito pesados e aumentando o consumo de hidrogênio. Já no protótipo brasileiro, foi desenvolvido um sistema compartilhado com um banco de baterias, permitindo o uso de pilha a combustível de menor peso, menor volume e que consumirá menos hidrogênio. Comparativamente, o ônibus europeu consume cerca de 17 quilos de hidrogênio para rodar 100 quilômetros, enquanto a previsão para o protótipo da COPPE é de um consumo inferior a 10 quilos de hidrogênio para os mesmos 100 quilômetros.

Seminário:

As novidades no desenvolvimento da tecnologia para ônibus com célula combustível a partir do hidrogênio serão apresentadas no VE 2006 - 4° Seminário e Exposição de VeículosElétricos, organizado pelo INEE - Instituto Nacional de Eficiência Energética. O evento debaterá todos os aspectos relacionados aos veículoselétricos, sejam a bateria, híbridos e de célula a combustível, envolvendo os tipos, a eficiência, o mercado, as pesquisas, a divulgação e a matriz energética.

Além do seminário haverá também uma exposição de tecnologias, produtos e serviços com as novidades dos mercados que envolvem os veículos elétricos, aberta ao público em geral.

O programa conta com palestras, painéis, mesa redonda e workshops dos quais participarão convidados nacionais e internacionais de grande expressão, que informarão e discutirão sobre este novo paradigma que revoluciona os setores automotivo, de transporte, energético e ambiental.

Os temas escolhidos são: Tipos de veículos elétricos e evolução esperada; Os veículos elétricos e a matriz energética brasileira; Ensino e pesquisa em veículos elétricos: preparando a geração de técnicos; A economia do hidrogênio, células a combustível e os veículos elétricos; Perspectivas para os acumuladores de energia nos veículos elétricos; Soluções para transporte de carga e logística; Veículos elétricos e transporte público; Ações para promoção dos veículos elétricos no Brasil e na América Latina; Regulamentação para veículos Elétricos; Veículos elétricos: eficiência e meio ambiente e Empresas de energia elétrica e os veículos elétricos.

O patrocínio é da UTE Norte Fluminense (UTE), da CPFL Energia, da Fundação Hewlett (Hewlett) e da Eletra Industrial (Eletra) e o apoio das seguintes entidades: Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE), Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Centro Universitário da FEI (Faculdade de Engenharia), Centro Nacional de Referência em Energia do Hidrogênio (CENEH).

Fonte: Ateliê da Notícia