Floresta com Araucárias será mais conservada

Editoria: Vininha F. Carvalho 26/06/2013

Na última segunda-feira (24), comemorou-se o Dia Nacional da Araucária, espécie típica da Floresta com Araucárias – ecossistema do Sul brasileiro reduzido a menos de 3% de sua cobertura original.

O dado está indicado no documento “Análise Integrada das Cadeias Produtivas de Espécies da Floresta Ombrófila Mista e seu Impacto sobre esse Ecossistema”, divulgado nesta semana pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, que encomendou em 2012 o estudo àFundação Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras (CERTI).

O estudo apresenta um diagnóstico detalhado sobre os processos produtivos do pinhão, que é a semente da araucária; e da erva-mate, outra espécie nativa do ecossistema.

A partir dos impactos identificados que a extração desses dois produtos geram atualmente nesse frágil ecossistema, foi elaborado um plano de ação.

Chamado de “Estratégia de Valorização da Floresta com Araucárias”, o plano prevê a criação e capacitação de uma instituição que investirá em novos e responsáveis usos para o pinhão e a erva-mate.

Esse projeto será desenvolvido pelas fundações Grupo Boticário e CERTI, contando, desde o começo de junho, com apoio do Governo do Estado de Santa Catarina, por intermédio da Companhia de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (CODESC).


- Um ecossistema em risco:

A Floresta Ombrófila Mista (FOM), mais conhecida como Floresta com Araucárias, é um ecossistema do Bioma Mata Atlântica que possuía originalmente 20 milhões de hectares, espalhando-se por áreas dos três estados do Sul brasileiro: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; além de São Paulo, Minas Gerais, Paraguai e Argentina.

Segundo o diagnóstico, apenas entre 1% e 3% desse total continuam com a cobertura original. Essa situação ocorre pela intensa exploração madeireira da araucária, principalmente a que aconteceu na segunda metade do século XX.

Por causa desse cenário, a árvore araucária (Araucaria angustifolia) é considerada como criticamente em perigo pela Lista Vermelha das Espécies Ameaçadas de Extinção, da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).


- Mitigando impactos negativos, gerando impactos positivos

Com base nesse histórico de degradação e nas atuais ameaças à Floresta com Araucárias, como o extrativismo desregulado e a criação de gado dentro da floresta, foi montada uma estratégia de conservação aliada ao modelo econômico regional.

“O projeto para fortalecer as cadeias produtivas do pinhão e da erva-mate está organizado de modo a reduzir o impacto negativo dessas culturas para o meio ambiente.

Além de reduzir a pressão sobre a Floresta com Araucárias, também pretendemos gerar impactos positivos, promovendo a inovação e a agregação de valor a esses produtos, valorizando assim a produção menos impactante à natureza”, explica Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário, instituição sem fins lucrativos de atuação nacional que tem como missão promover e realizar ações de conservação da natureza.

De acordo com dados de 2011 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil produziu 229.681 toneladas de erva-mate no período, gerando um valor de R$118,049 milhões. Já a produção de pinhão no mesmo período foi de 8.032 toneladas, com um retorno de R$10,955 milhões.

Além da importância econômica para o país, ambos os produtos têm forte identificação com a cultura do Sul brasileiro: a erva-mate é altamente consumida no tradicional chimarrão e o pinhão é consumido in natura ou como ingrediente em diversas receitas durante os meses de inverno.

Para Malu Nunes, o projeto visa a auxiliar também a população local. “Estamos unindo forças para aprimorar a produção da erva-mate e do pinhão, de modo que esses produtos da Mata Atlântica possam continuar existindo e proporcionando emprego e renda para a população”, diz.

Ela destaca ainda que, com a valorização desses itens, também será possível garantir a conservação de diversas espécies de vegetais e de animais que integram a tão degradada Floresta com Araucárias.


- Nós dependemos da araucária:

Algumas espécies-bandeira da Floresta com Araucárias vêm sofrendo ameaças pela degradação do ecossistema, pois dependem diretamente da conservação dessa floresta. Entre elas, destacam-se os psitacídeos papagaio-do-peito-roxo (Amazona vinacea) e papagaio-charão (Amazona pretrei), além de outra espécie de ave, o grimpeiro (Leptasthenura setaria).

A situação dos psitacídeos é bastante crítica: dados da UICN indicam que o papagaio-de-peito-roxo está em perigo de extinção; enquanto o papagaio-charão é considerado vulnerável. Ambas as espécies se alimentam de pinhão durante o inverno, sendo que a existência delas depende de áreas naturais conservadas.

Já o grimpeiro, também conhecido como rabo-de-espinho-da-araucária, embora não se alimente de pinhão, necessita da araucária porque faz seus ninhos apenas nas grimpas dessas árvores. A degradação da Floresta com Araucárias levou o grimpeiro ao status de ‘quase ameaçada’, de acordo com a UICN.


- Pinhão

A araucária fornece uma fonte de alimento muito importante: a sua semente, conhecida como pinhão, é rica em reservas energéticas, servindo para a alimentação humana, de animais domésticos e da fauna silvestre.

Segundo o diagnóstico, o pinhão também apresenta propriedades medicinais, sendo indicado para o combate à azia e à anemia. De acordo com uma pesquisa em andamento, conduzida pela Embrapa Florestas, o pinhão pode ser enquadrado como alimento funcional, pois é rico em ácido linoleico, que contribui para a regeneração neurológica.

O pinhão também é amplamente utilizado na culinária dos estados do Sul, sendo bastante característico nas festas juninas e em pratos típicos.

No diagnóstico sobre a cadeia produtiva do pinhão, foram levantadas os principais pontos de atenção que envolvem a extração desse produto da floresta.

“Dos fatores de impacto identificados, a remoção de pinhões da natureza e a presença de animais domésticos de grande porte, principalmente gado, são destacadamente os principais sobre a Floresta com Araucárias”, esclarece Marcos Da Ré, diretor do Centro de Economia Verde da Fundação CERTI e coordenador dos dois estudos realizados em 2012.


- Erva-mate:

A erva-mate (Ilex paraguariensis), também conhecida como ‘congonha’, é uma árvore nativa da Floresta com Araucárias. Da transformação de suas folhas e ramos, é produzida erva utilizada nas bebidas chimarrão, mate e tererê. A espécie ocorre no Sul e em alguns locais do Sudeste brasileiro.

As propriedades funcionais da erva-mate – como sua ação antioxidante e estimulante – são pouco exploradas pela indústria ervateira, fazendo com que esses atributos não sejam percebidos como diferenciais do produto.

A produção de erva-mate é uma atividade praticada predominantemente pela agricultura familiar, caracterizando um complemento de renda importante para pequenos proprietários.

“Como espécie nativa da Mata Atlântica, o cultivo da erva-mate pode favorecer a valorização econômica da floresta, promovendo-a como um ativo ambiental”, alerta a diretora-executiva da Fundação Grupo Boticário.

Os maiores impactos gerados pela exploração de erva-mate, assim como no caso do pinhão, são observados nas áreas remanescentes com a presença do gado.


- Replicação:

A região serrana de Santa Catarina foi escolhida como local para início do projeto por ser muito importante para a conservação da Floresta com Araucárias, estando em uma área com remanescentes contínuos desse ecossistema.

Parte deles estão protegidos pelo Parque Nacional de São Joaquim, uma unidade de conservação com 49.300 hectares de mata nativa conservada. Após a implementação do projeto piloto, a intenção é replicá-lo nas outras diversas regiões de exploração de pinhão e erva-mate, como Paraná e Rio Grande do Sul.

O projeto contempla ainda a criação de uma nova instituição, que será um agente articulador e facilitador, e que buscará investimentos para aplicação em novos usos para o pinhão e a erva-mate, além de estimular a produção sustentável dos produtos.

“Essa instituição será preparada por três anos e será um conector entre os produtores sustentáveis e um mercado diferenciado, mas também entre todos os outros atores envolvidos, como redes de pesquisa e desenvolvimento, investidores e representantes do poder público.

O objetivo é promover a inovação nessas cadeias sustentáveis, visando a expandir esses produtos para consumo nacional e internacional, com redução de impactos negativos e a propagação de impactos positivos para a conservação”, conclui Marcos Da Ré, ao citar a expertise da Fundação CERTI na incubação de empresas.


Fonte: Maria Luiza Campos

Endereço: